Rua que testemunhou importantes fatos
históricos nunca mais voltou a ser o centro pulsante da cidade.
Tanta
gente apressada,
Tanta
mulher bonita;
A
tagarelice dos bondes e dos
Automóveis,
Um
camelô gritando – alerta!
Algazarra.
Seis horas. Os sinos.
Joaquim
Cardoso
Na Ilha de Santo Antonio, onde hoje se situam
os bairros de Santo Antonio e de São José, o conde João Mauricio de Nassau-
Sieger fez erguer, a partir de 1637, a sua cidade Maurícia, chamada pelos
holandeses de Mauritsstad.
O Novo núcleo veio a ser unido à primitiva
povoação do Recife, através de uma longa ponte construída sob a direção do
judeu-português Balthazzar da Fonseca e inaugurada em 28 de fevereiro de 1643.
As suas ruas obedeciam ao projeto urbanístico do arquiteto holandês Pieter Post
(1608-1669), que nele incluíra dois palácios, Friburgo e a casa da Boa Vista,
bem como acrescera o prédio da igreja dos calvinistas franceses (hoje Igreja do
Espírito Santo).
A cidade Maurícia tinha por centro o Terreiro
dos Coqueiros no qual funcionava o “mercado grande”, onde, no século XVIII, foi
instalado um alto poste destinado ao suplicio dos condenados chamado de “pole”.
Naquele instrumento de tortura, o supliciado era içado pelas mãos por tirante,
tendo aos pés peso de ferro (ou chumbo!), e, depois de atingir certa altura
regulamentar, era largado abruptamente, deslocando com tal repuxo boa parte dos
ossos de seu corpo..., daí a primitiva denominação de Praça da Pole.
Quando da administração de D. Tomás José de
Melo (1787-1798), foram instaladas, na primitiva Praça da Pole, 62 casinhas
destinadas à venda de gêneros de primeira necessidade, substituídas depois por
lojas maiores e a conseqüente mudança do nome para Praça da União (1818).
Somente em 1883 passou a chamar-se de Praça
da Independência e, já na primeira metade do século XX, dela foram retirados
parte dos prédios que formavam o trecho conhecido por Rua Cabugá; área hoje
ocupada pelos jardins da praça, o que permitiu uma melhor visão da igreja
matriz de Santo Antonio.
A Praça da Independência veio a ser
popularmente como Pracinha do Diário, por nela estar situado o primitivo prédio
do Diário de Pernambuco, cuja redação nele funcionou até o ano de 2005. Fundado
em 07 de novembro de 1825, por Antonino José de Miranda Falcão, Diário é em
nossos dias o mais antigo jornal da América Latina e o decano da imprensa
diária em língua portuguesa.
Por muito tempo foi esta praça o “coração da
cidade, que pulsa aos influxos da religião, da política e dos movimentos
populares”. Sobre seu papel no centro da cidade, observa Tadeu Rocha, que “as
grandes procissões, os cortejos cívicos, os clubes carnavalescos (o próprio
carnaval) e as passeatas estudantis sempre cruzam este logradouro”.
Dominando a praça, encontra-se a Igreja do
Santíssimo Sacramento de Santo Antonio (1753-1790), monumento nacional de
visita obrigatória. Para Robert C. Smith, “de todas as grandes igrejas do
século XVIII do Recife, nenhuma teve a fortuna de conservar tão bem a aparência
como a Matriz de Santo Antonio. Seu frontispício, um dos mais belos do Brasil,
ainda se apresenta quase inalterados os traços característicos referidos em
antigos documentos”.
Antes de sua construção, ali existia a “casa
da pólvora”, utilizada pelos holandeses, dela restando dois prédios, adquiridos
pela Irmandade do Santíssimo Sacramento da Matriz do Corpo Santo, em 1752, para
a construção de sua igreja.
Em 20 de fevereiro de 1791, já com o templo
transformado em matriz, sob a denominação de Santíssimo Sacramento de Santo
Antonio, foi a nova irmandade nele instalada. O altar-mor em estilo rococó e
enriquecido por talhas douradas. Na sacristia, destaca-se o lavabo de mármore
que, partindo do solo, atinge o teto do salão. Destaque especial para o
Crucificado em marfim (altar-mor), Santo Antonio e pinturas de suas paredes.
Com sua fachada apresentando esculturas bem ao gosto do manuelino português,
modeladas em arenito dos arrecifes e com seu interior ornado por talhas e
imagens setecentistas, este templo é um dos mais bonitos da cidade.
Ainda na Praça da Independência, no antigo
prédio do Diário de Pernambuco, funcionava desde a segunda década do século XX,
um sonoro carrilhão considerado uma das atrações do centro de Recife.
Até então, antes do abandono e do descaso a
que foi condenada à Praça da Independência, foi o carrilhão do Diário de
Pernambuco o único da cidade de Recife a combinar o badalar do seu campanário
com as notas musicais inspiradas nos sinos do Grande Relógio Westminster
(Londres).
Na descrição do jornalista Arnoldo Jambo,
escrita em 1975, o hoje desaparecido Carrilhão do Diário, “fez-se original e
importante ao Recife... Por anos a fio plangeu ao escorrer das horas
recifenses... sob os cuidados do mecânico Manuel João – velho servidor do
Diário – ele há muito permanece; tratado carinhosamente, dedicadamente,
sentidamente como devem ser olhadas as coisas materiais que se espiritualizam
para dar sentido, tradição e vida à história que as cidades curtem e ajudam a
curtir no perpassar dos anos”.
O carrilhão era a nota característica do
centro nevrálgico da cidade, merecendo do poeta Mauro Mota os últimos versos do
poema Domingo no Recife:
“Assisto ao suicídio do domingo no
Recife, o domingo jogando-se da torre do “Diário” na música do carrilhão
batendo meia-noite. Receio de entrar na madrugada fria. Recolho na praça as
horas despedaçadas. Quero que este domingo seja a antecipação da eternidade”.
Leonarda Dantas
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