segunda-feira, 18 de outubro de 2010
MARTÍRIO DE MARIA E BIL LOBISOMEM
O leitor vai perceber
Lendo esse folheto
Que quem nasce está sujeito
A dor desprezo e lamento
Angústia, ódio, traição,
Desgosto e padecimento
O destino empurra a gente
Pra onde nem se imagina
Nas curvas que o tempo faz
Uma delas nos ensina
A ser bobo ou sonhador
Vilão, vítima, infrator,
Cada um cumpre a sua sina
Refiro-me a um ser humano
Que em Várzea Alegre chegou
No século XX passado
Com os pais que a gerou
E num pedaço de mundo
Da terra de São Raimundo
Mais de seis anos morou
Do estado de Alagoas
Chegou seu Clementino
Com Antonia sua esposa
Casal simples nordestino
E três filhos na companhia
Conhecidos por Maria
Madalena e Severino
Chegava à família para
Trabalhar na construção
Da barragem Olho D’água
Riqueza do nosso chão
Ficou morando com fé
No lugarejo Inharé
Um sítio da região
Mil novecentos e vinte
Era o ano em que chegava
E dos Fiúzas do Chico
Era a terra onde moravam
E bem no alto da serra
Da Charneca era a terra
Aonde mais trabalhavam
Assim os anos se passavam
Noite ia e dia vinha
Rendeiros dos proprietários
De toda a terra vizinha
Sem pensar nenhum momento
Num triste acontecimento
Com uma das filhas que tinha
Maria já era moça
Com a irmã Madalena
Cabelos longos e pretos
Simples baixinha e morena
Nos trabalhos da lavoura
Uma esperta agricultora
Daquela área terrena
Das bandas do Iguatu
No nordeste do Brasil
Apareceu um rapaz
Grotesco e pouco viril
Baixo e desconfiado
Moreno e mal encarado
E conhecido por Bil
Se interessou por Maria
Na linda terra do arroz
Planejaram a união
Com poucos meses depois
Casaram e a data lembro
Foi a cinco de novembro
Do ano vinte e dois
Na ribeira do Machado
Foi a maior alegria
O padre Lima de Lavras
Fez naquele mesmo dia
Vinte e cinco casamentos
E um daqueles sacramentos
Era o de Maria com bil
Da igreja de São Raimundo
Saíram com muita fé
Pra morar junto aos pais dela
No mesmo sítio Inharé
Naquela união de brilhos
Nasceu um casal de filhos
Que eram Nercília e José
Mas quando Maria estava
Grávida do filho terceiro
Teve um desentendimento
Com Bil o seu companheiro
Por Madalena causado
Que flertava pra o cunhado
Com um olhar traiçoeiro
Entre Bil e Madalena
Um caso amoroso havia
Numa questão familiar
Clementino não podia
Como pai naquela cena
Expulsar Madalena
E nem desprezar Maria
Bil afastou-se de casa
Como réu que se condena
E como paixão proibida
A qualquer um envenena
Voltou como um cão safado
Muito mais encegueirado
Na cunhada Madalena
As noites nos arredores
Das casas da vizinhança
De encontrar Madalena
Nas moitas tinha esperança
Nem lembrava da maldade
Que a esposa de verdade
Esperava uma criança
Uns contam que na verdade
O que Bil mais pretendia
Com vergonha do que fez
Era fugir com Maria
E ela sempre disse não
Devido sua traição
E o pai que ela obedecia
Assim Maria ficou
No mesmo sítio morando
Sobre a guarda do pai
Todo dia trabalhando
Pele tostada mão grossa
E nas tarefa da roça
A seu pai auxiliando
Numa das bocas de noite
Que Bil ali se escondia
Numa moita de mufumbo
Bem próximo da moradia
Com ouvidos de assassino
Escutou seu Clementino
Dando essa ordem a Maria
Maria amanhã você
Precisa ir deixar
O almoço lá na serra
Aonde vou trabalhar
Com outros trabalhadores
E as horas de horrores
Bil começou a planejar
Ouvindo o plano do velho
Bil se encheu de maldade
Com ódio no coração
Pensou na barbaridade
Em naquele mesmo dia
Assassinar a Maria
Na maior perversidade
Cumprindo as ordens do pai
Maria seguiu levando
A comida dos roceiros
Que estavam trabalhando
De passadas em passadas
Com mais duas camaradas
Que iam lhe ajudando
Das que subiam a serra
Maria ia no meio
Quando Bil surgiu do mato
E ao encontro dela
Com uma faca na mão
Foi a maior aflição
Agonia e aperreio
As companheiras correram
Vendo Maria gritar
Valei-me nossa senhora
E ouviram Bil falar
Brutal e grosseiramente
Que nem Deus onipotente
Podia ela salvar
Bil agarrando Maria
Começou a esfaqueá-la
Deu três facadas mortais
Com instinto de matá-la
Com gênio de monstro forte
Maltratando-a até a morte
E no caminho abandoná-la
Vendo o corpo de Maria
Morto no chão estirado
Cortou as duas batatas
Das pernas muito apressado
Aí comeu um pedaço
Pra não sofrer embaraço
E por ninguém ser encontrado
Colocou uma moeda
De mil reis na boca dela
Depois tirou toda a roupa
Que estava vestindo ela
Pôs o corpo da gestante
Em posição humilhante
Pra todos parentes dela
Às dez horas da manhã
Foi que o crime aconteceu
No dia onze de março
Várzea Alegre entristeceu
O ano era vinte e seis
Depois do crime que fez
O réu desapareceu
Depois uma das parceiras
De Maria foi contar
Para Vicente Bilé
Que resolveu
Morador do sitio Canto
Que mesmo sentindo espanto
Negou-se a testemunhar
Na casa de Clementino
A noticia foi chegada
Saíram desesperados
Na tal hora amargurada
Aí trouxeram Maria
Na rede pra moradia
Para poder ser velada
Foi enterrada no
Cemitério da saudade
Em Várzea Alegre e ninguém
Sabe informar na verdade
O lugar da cova dela
Por isso ninguém revela
Ao certo a localidade
Dizem que Bil virou bicho
Após cometer o ato
Quem passa na serra à noite
Pode sofre desacato
Ou tarde da noite ou cedo
Subir ou descer com medo
Ouvindo choro no mato
As moças perto das moitas
Tinham medo não passavam
Que o bicho chamado Bil
Com maldade as agarravam
As crianças no monturo
Se brincasse no escuro
Bil lobisomem pegavam
Pela alma de Maria
Muitos rezam na ladeira
O pai dela Clementino
Fez uma cruz de madeira
Fincou na beira da estrada
Marcando onde a filha amada
Viu a hora derradeira
Daí não faltou mais gente
Naquele triste local
Os ex-votos são levados
Na crença espiritual
Um paga graça outro pede
Porque Maria intercede
Na corte celestial
Muitos estudantes que
Tem pra vida um belo plano
Fazem promessa com ela
Pra poder passar de ano
Quem se apega a ela vence
Um mito varzealegrense
De nosso cotidiano
Políticos sobem a serra
Visitam sua capela
Agradecendo às vitórias
Que conseguiram por ela
Ex-doentes vão a pé
Pagar promessa na fé
Curaram-se através dela
A caminhada da fé
No mês de março é formada
Na maioria mulheres
É quem formam a caminhada
Maria é e Deus quer
Protetora da mulher
Aflita e desesperada
Desculpe leitor amigo
A história aqui se encerra
Pode até Maria um dia
Virar santa nessa terra
Bil se virou bicho mesmo
Deve estar vagando a esmo
Fazendo medo na serra.
Expedito Pinheiro
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Um belo poema que retrata uma triste história!!
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