segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

A BOTIJA




Dona Rosinha, como era chamada carinhosamente minha querida mãe, nos contava uma história interessante sobre uma botija. Dizia ela, sonhar freqüentemente com uma senhora de idade, não identificada na família e nem em amigas de seus pais. Insistia na existência de um vaso cilíndrico de barro com dinheiro e objetos de valor (jóias) no seu interior – mais conhecido como “pote de barro”, enterrado numa das casas que ficava defronte a Praça Siqueira Campos – Crato. Rua lado oposto a do cinema Cassino.
Passava por dificuldades financeiras e havia na personagem do sonho a intenção inconteste de ajudá-la; era um presente que ela estava lhe oferecendo. Dona Rosinha tinha verdadeiro pavor com a mínima possibilidade de ser uma médium. Quando contava algumas histórias e coincidências dessa natureza que acontecia com ela, os ouvintes sempre insistiam nessa possibilidade, ficava angustiada, desesperada. Pavor oriundo talvez pela rígida formação religiosa católica que tinha adquirido na educação a ela dirigida por meus avôs.
No popular quem arranca uma “botija” tem que sair do lugar. Daí outra dificuldade para tornar real essa operação. Não se imaginava sair do Crato e morar em qualquer outra localidade. A primeira já foi dita: dificuldade em acreditar que tinha poderes para contatos com pessoas já falecidas. De outro mundo.
Já bastante incomodada com esse fenômeno psíquico que ocorria involuntariamente durante o sono, resolveu contar a meu pai, primeiramente. Como ele não acreditava “nessas coisas” não deu a mínima atenção. Então resolveu também contar a outras pessoas. Familiares e amigas. Naquela época, entre 1957 e 1960, antes do advento da televisão, principal responsável pelo afastamento das pessoas. Havia o hábito salutar de se encontrem nas calçadas das casas, dependendo do ciclo de amizades, faziam verdadeiras “rodas”, como eram chamados os grupos que se reuniam deste modo. Realizavam essas rodas quase todas as noites. A calçada da casa de minha tia era uma das preferidas, dada sua localização privilegiada: defronte a praça mais importante da cidade: Siqueira Campos.
Numa noite dessas, numa grande roda, onde participavam além de parentes, vizinhos também, resolveu contar seu angustiante sonho. Todos a ouviram atentamente e saíram impressionados com o relato.
Tio Celso, esposo de tia Santa, começou as buscas do tesouro, escavando diversos cômodos de sua residência. Sem, contudo encontrar algo. Passou o tempo, nada mais comentou. A não ser as brincadeiras dirigidas a meu tio pelos incômodos praticados na família e o insucesso nas escavações realizadas. Muito tempo depois, resolveu o vizinho, inesperadamente e sem aparente motivo, mudar-se para a cidade do Recife.
Deixou sua casa fechada. Lá ostentava uma riqueza que não tinha anteriormente em sua cidade natal. Surgiu uma desconfiança. Até que foi então descoberto: Ele havia arrancado a botija e sem dizer nada foi embora pra capital pernambucana. Estava o tesouro procurado localizado em sua casa. Nunca mais aconteceu o sonho com minha mãe.

Heitor Figueiredo

Nenhum comentário:

Postar um comentário